quarta-feira, 16 de abril de 2014

FUTEBOL BRASILEIRO


Ary Brasil Marques

Comecei a gostar de futebol em 1938. Eu era criança e morava na cidade de Alfenas, em Minas Gerais. Naquele tempo, ouvíamos pelo rádio os narradores esportivos transmitir com detalhes e emoção as partidas de futebol do Rio e de São Paulo. Não havia televisão, mas era tal a perfeição dos locutores que “víamos” em nossa tela mental cada lance das partidas.

A Copa do Mundo de 1938 se realizou na França, e acompanhamos pelo rádio a transmissão feita pelo técnico da seleção brasileira, Adhemar Pimenta, pois naquele tempo as emissoras não tinham recursos para enviar seus profissionais a viagens internacionais. De longe, embora com as deficiências de uma rádio cheia de chiados e de pouca qualidade, vibramos com as defesas de Batatais, as avançadas de Zezé Procópio e os gols de Leônidas.

O Brasil ficou em terceiro lugar, pois foi prejudicado pelo juiz no jogo com a Itália. A bola havia saído pela linha de fundo, portanto não estava mais em jogo, quando Domingos da Guia, o nosso extraordinário zagueiro, atingiu o atacante italiano na área brasileira. Não era possível dar o pênalti que o juiz deu, pois a bola havia saído antes. Essa penalidade determinou a vitória da Itália na semifinal, e os italianos acabaram sendo campeões.

De acordo com a imprensa do mundo inteiro, a melhor seleção foi a do Brasil, que encantou a todos com jogadas magistrais.

A partir dessa data, o Brasil se agigantou no futebol. A guerra fez com que a Copa do Mundo ficasse muitos anos sem ser disputada.

Em 1950 a Copa do Mundo foi no Brasil. O Maracanã, maior estádio do mundo, foi construído para essa competição.

O Brasil venceu todos os adversários com facilidade, e entrou em campo para disputar a final com o Uruguai como favorito, pois tinha uma equipe muito melhor do que as equipes competidoras.

Com o estádio lotado, mais de 200.000 espectadores, fomos derrotados por 2 x 1. Foi uma decepção. Os nossos supercraques foram vencidos, e aprendemos com amargura que ninguém é imbatível e que os adversários também sabem jogar e podem vencer.

A decepção de 1950 foi esquecida pela maravilhosa vitória da seleção brasileira na Copa do Mundo da Suécia em 1958, quando mostramos ao mundo craques espetaculares como Pelé, Garrincha, Didi e Nilton Santos, entre outros.

Em 1962, no Chile, repetimos a dose, o mesmo acontecendo depois, no México, em 1970, quando fomos tri campeões mundiais.

Os jogadores brasileiros passaram a ser considerados os melhores do mundo, e houve um grande êxodo de jogadores para o exterior.

Quando o Brasil entrava em campo, os adversários tremiam diante da camisa amarela de nossa seleção.

O Brasil alcançou o tetra e posteriormente o penta campeonato, sempre demonstrando muita técnica, garra e superioridade ante os países mais poderosos do mundo na prática do futebol.

Fomos acostumados a ganhar. O Brasil era considerado por todos o país do futebol, e sempre entrava em campo para disputar o título de campeão.

Quem viu jogadores do nível de Zizinho, Ademir da Guia, Leônidas, Didi, Garrincha e o maior deles, Pelé, não pode entender como hoje aquele futebol de sonho tenha se transformado em um futebol monótono, de troca de passes no meio do campo, sem trazer perigo aos adversários.

Durante 90 minutos, são poucos os lances de brilho, de jogadas individuais acima da média, de demonstração de garra e de vontade de vencer.

Estamos perdendo a antiga valentia, a classe, o improviso característico do jogador brasileiro.

Os técnicos de hoje armaram defesas que baseiam o seu jogo muito mais na força física do que na técnica, e não conseguem mais usar da grande capacidade de improviso dos craques, pois os chamados craques de hoje não são nem de longe a sombra do que foram os do passado.

Com tristeza, nos dias de hoje, vemos a camisa amarelinha de nossa seleção, tão cheia de glórias, ser vencida com relativa facilidade por seleções de países que sempre foram derrotados por nós.

Ainda bem que a seleção brasileira feminina está se apresentando ao mundo com o brilhantismo que esperávamos de nossa equipe masculina.

“Quousque tandem patientia nostra”, futebol brasileiro.


SBC, 19/08/2008.

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