Leopoldo Cirne
Leopoldo
Cirne foi, sem sombra de dúvida, um dos grandes vultos do Espiritismo no
Brasil. Esta é a conclusão a que facilmente podemos chegar, após conhecermos a
sua vida, e a valiosa obra literária, onde o insigne autor demonstra fielmente
o seu empenho no estudo, na divulgação e na defesa dos princípios que norteiam
a Codificação.
Doutrina
e Pratica do Espiritismo, Anticristo, Senhor do Mundo, O Homem Colaborador de
Deus, Memória Histórica do Espiritismo (que me falta na coleção e ainda não
encontrei para ler) marcaram época na produção litero-espírita onde desponta, também,
Cairbar Schutel, outro grande do Espiritismo. A imensa bagagem cultural e espírita
de que era portador faz-nos lembrar, nos dias de hoje, Carlos Imbassahy, Herculano
Pires, Deolindo Amorim, Aureliano Alves Neto, Hermínio C. Miranda, Carlos
Bernardo, entre outros.
Há
tanta coisa para se dizer de Leopoldo Cirne como jornalista, polemista,
escritor, orador e administrador que se torna impossível, de uma só vez, dado o
espaço de que dispomos.
Leopoldo
Cirne nasceu na Paraíba (Nordeste do Brasil) no dia 13 de abril de 1.870. Logo
demonstrou ser uma criança inteligente e com vontade de estudar. Aos onze anos
de idade foi obrigado a interromper os estudos a que se vinha dedicando.
Já
residindo em Recife (no vizinho Estado de Pernambuco), tendo de ir trabalhar no
comércio, não lhe sobrava tempo para outra atividade pois, naquela época, os empregados
ainda não estavam amparados pela moderna legislação trabalhista.
Em
1.891, transferiu-se para o Rio de Janeiro onde foi morar (Estado situado ao
Sudeste do Brasil).
O
Dr. Canuto de Abreu, por sua vez, narra que Leopoldo Cirne foi seduzido pela filosofia.
Alfredo Pereira o levara a uma sessão de sexta-feira. Nada sabia Cirne de Espiritismo
e era materialista. Discutia-se, naquela noite de 1.894, a tese: Como conciliar
o livre-arbítrio com o determinismo da prova. Terminada a sessão, em vez de transmitir
sua impressão primeira sobre o meio, como em geral se faz, Cirne entrou a discutir
com Alfredo Pereira a tese do dia como se fosse um veterano. Grande psicólogo,
Alfredo percebeu a espontânea conversão do materialista e seu grande talento.
Deu-lhe um exemplar de O Livro dos Espíritos e pediu-lhe que usasse da palavra
na próxima sexta-feira, em que voltaria a debater o mesmo assunto: a filosofia.
As
forças latentes do seu formoso espírito despertaram para a missão, como raios
do Sol de meio-dia, renascido da nuvem. Não conseguiu ler, no O Livro dos Espíritos,
mais do que a Introdução, essa obra-prima de Kardec. Pôs de lado o livro, como
se encerrasse um assunto sabido. Era espírita de nascença, como Bezerra de
Menezes. E quando Dias da Cruz, na sessão seguinte, coloca em discussão a tese,
foi com desconfiança e curiosidade geral que aquele novato de olhos azuis,
queixo saliente sobre o colarinho alto, bonito e elegante, pediu a palavra,
tirou do bolso uma tiras de papel e falou.
O
presidente sussurrou ao ouvido de Alfredo Pereira:
-
Quem é esse moço?
-
Um amigo de Pernambuco, que me veio recomendado pelo Teodureto Duarte.
-
Agarra-o para nós, precisamos dele.
-
Já está seguro. Vai ajudar-me no Reformador.
E
assim foi. Durante vinte anos o Reformador (a revista espírita brasileira mais antiga),
teve nele uma pena de mestre. O melhor de sua vida. Toda mocidade foi sacrificada
à propaganda oral e escrita da filosofia que o empolgara desde o primeiro instante.
Ninguém o excedeu em sacrifício de tempo, de saúde, de renúncia aos prazeres mundanos
em holocaustos à Doutrina.
No
dia 11 de abril de 1.900 desencarna Bezerra de Menezes, então Presidente da Federação
Espírita Brasileira, e L. Cirne, na qualidade de vice, assumiu a presidência da
Casa de Ismael (Patrono espiritual do Brasil), cargo em que permaneceu até o
ano de 1.913.
Em
1.911, Leopoldo Cirne inaugurou a nova sede da FEB, iniciada por ele. Ainda na gestão
de Leopoldo, a FEB reuniu vários Centros Espiritas do Rio de Janeiro e de
outros Estados, (na então Capital do Brasil), resultando desse encontro o
programa unificacionista Bases de Organização Espírita, no dia 01 de outubro de
1.904, que num processo de aperfeiçoamento na prática floresceu no Pacto Áureo
05/10/1.949 e finalmente resultou na madureza do atual Conselho Federativo
Nacional. Foi ainda no dia 04 daquele mês e ano que a FEB promoveu a
comemoração do 1.º Centenário de Nascimento de Allan Kardec.
O
seu tipo físico nos é retratado pelo brilhante confrade jornalista, escritor e
tradutor, Francisco Klors Wernec (hoje na espiritualidade) em carta que nos enviou,
em 28/05/1.973: Eu ainda não era espírita e me achava longe de o ser quando me
encontrava na rua com um senhor alto, claro, calvo e de grandes bigodes, o
qual, mais tarde, vim a saber que se tratava de Leopoldo Cirne, de saudosa
memória.
As
suas traduções de No Invisível e Cristianismo e Espiritismo do
grande Léon Denis, veem tendo as suas reedições asseguradas pelo Departamento
Editorial da FEB.
Wantuil
de Freitas considera Leopoldo Cirne como um dos grandes pensadores do movimento
Espírita do País, sendo mesmo cognominado - O Léon Denis Brasileiro.
A
sua desencarnação ocorreu no Rio de Janeiro-RJ, no dia 31 de julho de 1.941. Já
no mês seguinte, a revista Reformador, órgão oficial da Federação Espírita
Brasileira, em edição que guardamos em nosso modesto arquivo, trazia em suas
páginas aquele acontecimento, e das quais extraímos os seguintes dizeres:
(...)
Tendo ainda, a serviço da inteligência e do coração, cujos dotes se consorciavam
admiravelmente, o dom, precioso para um expositor de doutrina, de uma palavra
fácil, correntia, eloquente por vezes e sempre clara e tocante, ele se afirmou,
presidindo a Federação, exímio pregador e instrutor notável, a cuja penetração
mental nenhum embaraço insuperável oferecia qualquer ponto da matéria que
versava, por mais obscuro e intrincado que fosse. (...) Por outro lado, em
Leopoldo Cirne, teve o Espiritismo um escritor de muito merecimento. De pendor
ingênuo para o jornalismo, manejando a pena com invulgar destreza, sabendo
exprimir em estilo correto os pensamentos e desenvolver com clareza suas ideias
e com apurada lógica na argumentação, o Reformador guarda, em suas coleções,
enorme série de seus excelentes artigos, mesmo notáveis muitos, assim como estudos
amplos e aprofundados das mais importantes questões doutrinárias e de assuntos
filosóficos em geral. (...) Por isso e porque sabemos que nada ocorre à revelia
da lei divina, que tudo tem a sua razão de ser providencial, e, portanto,
justa, não lhe lamentamos a partida, como o faríamos se a encarássemos do ponto
de vista estritamente humano, senão que com ele nos congratulamos, por se lhe
haverem aberto as portas do cárcere da carne, para lhe ser dado, conforme
certamente ocorreu, comparecer diante do Mestre Divino, a dizer-lhe Aqui está,
Senhor, o teu servo cumpriu o que lhe ordenaste, dispõe dele como aprouver a
tua sabedoria e a tua misericórdia.
Fonte:
Grupo
de Estudos Avançados Espíritas (GEAE).
Bibliografia:
Grandes
Espíritas do Brasil,
Zeus Wantuil.
Bezerra
de Menezes,
Canuto Abreu.
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