Muito
se tem escrito sobre a personalidade de Allan Kardec, existindo mesmo várias e
extensas biografias sobre a sua obra missionária.
É
sobejamente conhecida a sua vida anteriormente ao dia 18 de abril de 1857,
quando publicou a magistral obra "O Livro dos Espíritos", que deu
início ao processo de codificação do Espiritismo.
Nesta
súmula biográfica, procuraremos esboçar alguns informes sobre a sua
inconfundível personalidade, alguns deles já do conhecimento geral.
O
seu verdadeiro nome era Hippolyte-Léon-Denizard Rivail. "Hippolyte"
em família; "Professor Rivail" na sociedade e "H-L-D
Rivail" na literatura era desde os 18 anos mestre colegial de Ciências e
Letras e desde os 20 anos renomado autor de livros didáticos. Suas obras
espíritas foram escritas com o pseudônimo de Allan Kardec.
Destacou-se
na profissão para a qual fora aprimoradamente educado na Suíça, na escola do
maior pedagogo do primeiro quartel do século XIX, de fama mundial e até hoje
paradigma dos mestres: João Henrique Pestalozzi. Em Paris sucedeu ao próprio
mestre.
Allan
Kardec contava 51 anos quando se dedicou à observação e estudo dos fenômenos
espíritas, sem os entusiasmos naturais das criaturas ainda não amadurecidas e
sem experiência. A sua própria reputação de homem probo e culto constituiu o
obstáculo em que esbarraram certas afirmações levianas dos detratores do
Espiritismo. Dois anos depois, em 1857, divulgava "O Livro dos
Espíritos". Em 1858 iniciava a publicação da famosa "Revue
Spirite". Em 1861 dava a lume "O Livro dos Médiuns". Em 1864
aparecia "O Evangelho segundo o Espiritismo" seguido de "O Céu e
o Inferno" em 1865. Finalmente, em 1868 "A Gênesis Os Milagres e as
Predições", completava o Pentateuco do Espiritismo.
Na
ingente tarefa de codificação do Espiritismo, Allan Kardec contou com o valioso
concurso de três meninas que se tornaram as médiuns principais no trabalho de
compilação de "O Livro dos Espíritos": Caroline Baudin, Julie Baudin
e Ruth Celine Japhet. As duas primeiras foram utilizadas para a concatenação da
essência dos ensinos espíritas e a última para os esclarecimentos
complementares. Ultimada a obra e ratificados todos os ensinamentos ali
contidos, por sugestão dos Espíritos, Allan Kardec recorreu a outros médiuns,
estranhos ao primeiro grupo, dentre eles Japhet e Roustan, médiuns intuitivos;
a senhora Canu, sonâmbula inconsciente; Canu, médium de incorporação; a Sra.
Leclerc, médium psicógrafa; a Sra. Clement, médium psicógrafa e de
incorporação; a Sra. De Pleinemaison, auditiva e inspirada; Sra. Roger,
clarividente; e Srta. Aline Carlotti, médium psicógrafa e de incorporação.
Escrevendo
sobre a personalidade do ínclito mestre, o emérito Dr. Silvino Canuto Abreu
afirmou o seguinte: "De cultura acima do normal nos homens ilustres de sua
idade e do seu tempo, impôs-se ao geral respeito desde moço. Temperamento
infenso à fantasia, sem instinto poético nem romanesco, todo inclinado ao
método, à ordem, à disciplina mental, praticava, na palavra escrita ou falada,
a precisão, a nitidez, a simplicidade, dentro dum vernáculo perfeito, escoimado
de redundâncias."
De
estatura meã, apenas 165 centímetros, e constituição delicada, embora saudável
e resistente, o professor Rivail tinha o rosto sempre pálido, chupado, de
zigomas salientes e pele sardenta, castigado de rugas e verrugas. Fronte
vertical comprida e larga, arredondada ao alto, erguida sobre arcadas
orbitárias proeminentes, com sobrancelhas abundantes e castanhas. Cabelos lisos
e grisalhos, ralos por toda a parte, falhos atrás (onde alguns fios mal
encobriam a larga coroa calva da madureza), repartidos na frente, da esquerda
para a direita, sem topetes confundidos nos temporais, com as barbas grisalhas
e aparadas que lhe desciam até o lóbulo das orelhas e cobriam, na nuca, o
colarinho duro, de pontas coladas ao queixo. Olhos pequenos e afundados, com
olheiras e pápulas. Nariz grande, ligeiramente acavaletado perto dos olhos, com
largas narinas entre rictos arqueados e austeros. Bigodes rarefeitos, aparados
à borda do lábio, quase todo branco. Pera triangular sob o beiço, disfarçando
uma pinta cabeluda. Semblante severo quando estudava ou magnetizava, mas cheio
de vivacidade amena e sedutora quando ensinava ou palestrava. O que nele mais
impressionava era o olhar estranho e misterioso, cativante pela brandura das
pupilas pardas, autoritário pela penetração a fundo na alma do interlocutor.
Pousava sobre o ouvinte como suave farol e não se desviava abstrato para o vago
senão quando meditava a sós. E o que mais personalidade lhe dava era a voz,
clara e firme, de tonalidade agradável e oracional, que podia mesclar
agradavelmente desde o murmúrio acariciante até as explosões de eloquência
parlamentar. Sua gesticulação era sóbria, educada. Quando distraído, a ler ou a
pensar, confiava os "favoris". Quando ouvia uma pessoa, enfiava o
polegar direito no espaço entre dois botões do colete, a fim de não aparentar
impaciência e, ao contrário, convencer de sua tolerância e atenção. Conversando
com discípulos ou amigos íntimos, apunha algumas vezes a destra no ombro do
ouvinte, num gesto de familiaridade. Mantinha rigorosa etiqueta social diante
das damas.
Pelo
seu profundo e inexcedível amor ao bem e à verdade, Allan Kardec edificou para
todo o sempre o maior monumento de sabedoria que a Humanidade poderia
ambicionar, desvendando os grandes mistérios da vida, do destino e da dor, pela
compreensão racional e positiva das múltiplas existências, tudo à luz meridiana
dos postulados do ninfo Cristianismo.
Filho
de pais católicos, Allan Kardec foi criado no Protestantismo, mas não abraçou
nenhuma dessas religiões, preferindo situar-se na posição de livre pensador e
homem de análise. Compungia-lhe a rigidez do dogma que o afastava das
concepções religiosas. O excessivo simbolismo das teologias e ortodoxias
tornava-o incompatível com os princípios da fé cega.
Situado
nessa posição, em face de uma vida intelectual absorvente, foi o homem de
ponderação, de caráter ilibado e de saber profundo, despertado para o exame das
manifestações das chamadas mesas girantes. Há esse tempo o mundo estava
voltado, em sua curiosidade, para os inúmeros fatos psíquicos que, por toda a
parte, se registravam e que, pouco depois, culminaram no advento da altamente
consoladora doutrina que recebeu o nome de Espiritismo, tendo como seu
codificador, o educador emérito e imortal de Lyon.
O
Espiritismo não era, entretanto, criação do homem e sim uma revelação divina à
Humanidade para a defesa dos postulados legados pelo Meigo Rabi da Galileia,
numa quadra em que o materialismo avassalador conquistava as mais pujantes
inteligências e os cérebros proeminentes da Europa e das Américas.
A
primeira sociedade espírita regularmente constituída foi fundada por Allan
Kardec, em Paris, no dia 1º de abril de 1858. Seu nome era "Sociedade
Parisiense de Estudos Espíritas". A ela o codificador emprestou o seu
valioso concurso, propugnando para que atingisse os nobilitantes objetivos para
os quais fora criada.
Allan
Kardec é invulnerável à increpação de haver escrito sob a influência de ideias
preconcebidas ou de espírito de sistema. Homem de caráter frio e severo
observava os fatos e dessas observações deduzia as leis que os regem.
A
codificação da Doutrina Espírita colocou Kardec na galeria dos grandes
missionários e benfeitores da Humanidade. A sua obra é um acontecimento tão
extraordinário como a Revolução Francesa. Esta estabeleceu os direitos do homem
dentro da sociedade, aquela instituiu os liames do homem com o universo,
deu-lhe as chaves dos mistérios que assoberbavam os homens, dentre eles o
problema da chamada morte, os quais até então não haviam sido equacionados
pelas religiões.
A missão do ínclito mestre, como havia sido prognosticada pelo Espírito de Verdade, era de escolhos e perigos, pois ela não seria apenas de codificar, mas principalmente de abalar e transformar a Humanidade. A missão foi-lhe tão árdua que, em nota de 1o. de janeiro de 1867, Kardec referia-se as ingratidões de amigos, a ódios de inimigos, a injúrias e a calúnias de elementos fanatizados. Entretanto, ele jamais esmoreceu diante da tarefa.
A missão do ínclito mestre, como havia sido prognosticada pelo Espírito de Verdade, era de escolhos e perigos, pois ela não seria apenas de codificar, mas principalmente de abalar e transformar a Humanidade. A missão foi-lhe tão árdua que, em nota de 1o. de janeiro de 1867, Kardec referia-se as ingratidões de amigos, a ódios de inimigos, a injúrias e a calúnias de elementos fanatizados. Entretanto, ele jamais esmoreceu diante da tarefa.
Texto
retirado da Federação Espírita do Estado de São Paulo
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